segunda-feira, 21 de agosto de 2017

POR QUE NÃO COMEÇAMOS PELAS TARTARUGAS?


Tartaruga marinha verde, semelhante a que encontrei na praia de Salvaterra. (Foto: Projeto Tamar)

Dia desses minha namorada lembrou que mês que vem de setembro começam as tartarugas a se reproduzir nas praias de Melgaço...

Eu nem tinha conhecimento que as grandes tartarugas da Amazônia se reproduziam nas praias de 
Melgaço. E, se elas se reproduzem em Melgaço... devem se reproduzir nas praias de areia branca de Portel também... E logo me veio à cabeça aquele espetáculo de centenas, milhares de pequenas tartarugas correndo na areia, procurando as águas do rio. Nunca tinha ouvido falar desse espetáculo da natureza em Portel. Mas esse espetáculo ocorria, e não faz tanto tempo atrás...

Lembrei-me de um episódio que aconteceu comigo quando estava na Pousada dos Guarás, localizada à beira da Praia Grande, em Salvaterra, no Marajó. Eu trabalhava no turismo receptivo da pousada em Belém, e estava em Salvaterra para acompanhar algum serviço por lá. Era uma noite de sábado monótona e eu trocava conversa com o gerente Zé Luís na recepção, aguardando a troca de turno do recepcionista da noite, que estava atrasado para o trabalho. De repente veio um empregado da pousada à recepção, cansado, quase afônico, falando que o recepcionista havia encontrado algo incrível quando vinha pela praia e precisava de ajuda, pediu então para levarmos um carro de mão. Eu segui andando pela areia, esperando encontrar algo fantástico, uma cobra grande, uma sereia, um extraterrestre... Quando cheguei, o recepcionista havia encontrado uma tartaruga marinha na areia.
A tartaruga marinha era enorme. Nunca havia visto pessoalmente um animal daqueles. Ela tinha a cabeça cônica e pontuda, típica da espécie, era toda esverdeada na cabeça e no casco, de um verde marinho vivo, e nas partes de baixo, pescoço e nadadeira, ela era branca. Essa espécie chega a medir quase um metro e meio de comprimento da carapaça e pesar até 170 quilos. Eram essas mais ou menos a medida daquela que via ali na minha frente.

Colocamos nós três com muito o esforço o animal no carrinho de mão e levamos até a pousada. Os rapazes não se calavam de tanta empolgação. Quantos anos um animal daqueles não era visto por ali! Haviam ouvido apenas os antigos falarem dele na região. Imagina quando mostrassem aos outros! E que gostoso não ficaria um animal daqueles na panela! Dava uma sopa enorme!

Na falta de um local melhor, deixamos o animal na recepção mesmo, observado pelo recepcionista de plantão. Eu fui para o meu quarto me deitar. Mas do quarto, ouvia a tartaruga se debater na recepção, tentando encontrar um caminho para a água. Comecei a pensar como era raro encontrar uma tartaruga marinha no Marajó, quantos milhares de quilômetros aquele animal não havia nadado, se livrado de redes e predadores para tentar botar seus ovos ali na Praia Grande, até ser pego pelo predador homem. E lá eu ouvia a tartaruga se debatendo no chão da recepção. Seu pescoço arfando lembrava o pescoço de um ser humano branco e gordo, cansado e com dificuldade de respirar. Não consegui dormir. Decidi que era hora de salvar aquele animal.

Cheguei com o recepcionista e dei a ordem: “Edmilson, me ajuda a colocar a tartaruga no carrinho de mão que nós vamos soltar esse animal!”. “Mas como!” respondeu ele. “O que vai falar o pessoal amanhã de manhã?!”. Eu expliquei melhor a ele: “olha, esse é um animal protegido pela legislação. Amanhã um dos hóspedes vê essa tartaruga em cativeiro aqui, ou pior, vê que nós matamos uma espécie rara, ele vai denunciar no IBAMA (órgão de proteção ambiental) e nós vamos responder por um crime. E ainda vamos aparecer na televisão como uma pousada, que se diz ecológica, mas que mata animal ameaçado de extinção”. Ele me ouviu contrariado, mas admitiu a contragosto “é...”.  Carregamos o animal no carrinho de mão até a areia onde o soltamos. Observei como a tartaruga quase não tinha forças para entrar na água, até que foi devagar e desapareceu em meio às ondas. Voltei pra pousada pensando “a coitada foi embora e nem sequer conseguiu botar os ovos...”.

No mesmo dia, ainda nem havia levantado o sol, fui acordado em meu quarto com uma batida insistente na porta: “onde estava a tartaruga?!”. E lá fui eu mais uma vez explicar a situação, não podíamos matar um animal daqueles na pousada. A revolta foi geral, me livrei por pouco de ser linchado pelos colegas de trabalho, não fosse eu, de certa forma, um superior hierárquico a eles. O gerente do restaurante dizia: “como eu podia fazer isso? um animal daqueles ia dar para servir vários dias no restaurante!”. Outro ainda dizia cinicamente que o objetivo não era matar, mas sim amarrar o animal a um fio e soltar na lagoa, para mostrar para os turistas. Como pode um animal marinho viver em uma lagoa de água doce? Quanta ignorância, a maioria não negava que o objetivo verdadeiro era matar e comer o animal. Não importava quão raro ele fosse. O prazer mesmo era exterminar um animal raro. Fiquei impressionado com tamanha voracidade.

Lembrei desse fato quando ouvi que as tartarugas da Amazônia estavam para começar a postura de ovos nas praias de Melgaço. A maioria delas não escapará da panela. Houve uma época, não tanto tempo atrás, em que as tartarugas marinhas procuravam as praias do Marajó para por os seus ovos, provavelmente também nas praias de Mosqueiro, Outeiro, entrando pelo rio Pará. Hoje ninguém mais ouviu falar dessas tartarugas marinhas. Da mesma forma, há algumas décadas atrás as tartarugas da Amazônia ainda procuravam as areias da praia do Arucará para por seus ovos. A postura de ovos pelas tartarugas é uma festa da natureza, as milhares de tartaruguinhas quando nascem oferecem um banquete para diversas espécies de aves, jacarés, e outros animais. Proteger as tartarugas é garantir a sobrevivência de inúmeras outras espécies.  Hoje a população nem ouviu falar de tartarugas nas praias do Arucará. Imaginei se alguma, seguindo seus instintos, chegasse até a praia, como não demoraria nada a surgir o predador homem para pegá-la, matá-la e levá-la à panela.

As pessoas na Amazônia matam os animais não só por necessidade de alimentação, matam também por um prazer primitivo, irracional de devorar um animal de caça, quando não pelo próprio prazer de matar. Ato esse que vem, não do índio, que tira da natureza apenas aquilo que precisa para sua alimentação, mas sim dos nossos antepassados nordestinos, que chegaram  à Amazônia desde meados do século XIX para extrair borracha. Era um desespero de quem saiu de uma região seca e se encontrou então em um novo meio, rico em fauna, e sentiu prazer em matar só pra provar o novo alimento. Podendo ter vindo igualmente do colono português, em sua ânsia voraz de dominar a natureza selvagem.

Meu avô, que era nordestino e veio do estado do Rio Grande do Norte, contava que certa vez no interior, estava um bando de dezenas de capivaras a atravessar o rio Pacajá. Seus vizinhos não se satisfizeram até matar todas, todas. Muito mais do que precisavam para matar a fome. Hoje as capivaras já há muito desapareceram dos rios de Portel, juntamente com as antas e outros animais de grande porte. Mesmo destino que tiveram as tartarugas da praia do Arucará.

Tartarugas da Amazônia pondo ovos em praia na reserva de Abufari, estado do Amazonas. (Foto: www.blogdotiao.com)


Hoje em dia, em muitas áreas de Portel, esta dizimação da fauna já chega um a ponto crítico. Em muitas localidades a população já começoua substituir a alimentação tradicional por alimento industrializado. É hora de rever essa relação com a natureza. É mais do que hora de sair de uma relação puramente predatória para uma relação de respeito. O domínio da natureza deve ser feito não pela depredação, mas sim pelo conhecimento. É grande o potencial de geração de renda pelo manejo de população de animais selvagens. Em vez de matar, deveríamos manejar. Que tal se, em vez de ficarmos na cidade, saíssemos para o interior para conhecer os hábitos de reprodução das cutias, seus habitats, que tal catalogarmos as populações de macacos guaribas, conhecermos seus comportamentos? E fazer isso não só de curiosidade, mas registrar essas informações e dados?

A melhor forma de se apropriar de uma região é conhecer sobre ela. Se os portelenses quiserem tomar conta do seu município, vão ter que produzir conhecimento sobre sua terra. Só aprende a valorizar quem conhece. A criação e reprodução de animais selvagens em cativeiro ou em áreas monitoradas pode gerar renda através da culinária, com o prato típico do jabuti na castanha, desta vez criado em cativeiro, por exemplo. Pode também gerar renda através do turismo ecológico, turistas pagam uma grana para ver capivara e jacaré em fazendas do Marajó, poderiam também pagar para vê-los em Portel.

Tanta gente em Portel reclamando da falta de oportunidades, por que não começam projetos para registrar e manejar a fauna?

Quando se faz essa pergunta a um portelense logo vem a resposta pronta: “aqui não dá certo”. Portel 
é a cidade em que todo mundo sabe que nada dá certo, muito embora ninguém tenha sequer uma vez tentado. Se pensassem da mesma maneira na Bahia, o projeto Tamar nunca teria dado certo.
Essa relação sustentável e amigável com a fauna poderia se expandir para outras áreas, para a agricultura, para a geração de alimento, para a piscicultura. Poderíamos tirar o município da miséria e ainda servir de exemplo. Tudo depende de iniciativa.


Mês que vem as tartarugas procuram as praias para botar seus ovos, por que não começamos a proteger as tartarugas?

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

O BAILE DA MUSA VERÃO 2017

Gerusa Balieiro desfila para os jurados

Neste último sábado, dia 29 de julho, a prefeitura realizou a 29ª edição do tradicional Baile da Musa Verão.  A cidade padece com os atrasos frequentes no pagamento dos salários do funcionalismo público, e com o atendimento pela agência do Banco do Brasil, a principal das duas únicas agências de banco num município, onde o acesso da internet é restrito e precário. Não basta a prefeitura atrasar os salários, quando paga, muitas vezes a agência do Banco do Brasil não tem dinheiro, ou não se encontra aberta em horário adequado para atender o público. A situação se agravou tanto que alguns comerciantes procuram realizar uma audiência com a presença do Ministério Público para resolver o problema. Mas essa tentativa até agora não logrou atrair interesse da população, ou do prefeito.

No entanto, nenhum desses fatos, ainda que da maior importância, merece tamanha atenção como a escolha da musa do verão portelense.

A prefeitura, disposta a transformar a coroação da musa no auge da programação das férias de julho, investiu na realização do baile. Em vez da motoneta Honda Biz dos anos anteriores, este ano a prefeitura comprou para a vencedora uma moto cross Honda NXR 160 cc Bros nova. Moto que custa mais de R$ 11.000,00, prêmio esse que é o sonho de qualquer garota da cidade. Deste modo, o baile da Musa Verão 2017 deveria coroar a programação de férias de uma administração até agora sem brilho, sem realizações e sem inaugurações entregar para a população.

Desta vez, a festa voltou a ser realizada na sede do tradicional clube de futebol Camel, local onde era originalmente realizado o baile há mais de vinte anos atrás. No ano, o baile ocorreu no estádio Felizardo Diniz, este bem mais amplo e com maior público, mas sem as características de um grande baile. No ano passado o local escolhido foi a arena fechada em frente à praia, que tantas críticas gerou ao então prefeito por parte da oposição, que o acusava de “privatizar” a praia. Com a volta do baile ao seu antigo local de origem, era minha esperança que o baile voltasse a ter o glamour de antigamente. No entanto, se no passado a festa guardava um certo glamour, com a sede social ricamente decorada pelo José Maranhão, e o público elegantemente vestido a caráter para a ocasião, no melhor do traje social, desta vez a sede não tinha nada de decoração para a festa, e o público já não se traja mais com a elegância de duas décadas atrás.

De decoração feita pela SECELT (Secretaria de Cultura, Esporte, Lazer e Turismo) mesmo, apenas um enorme palco de quase dois metros de altura, que serviu só para dificultar a visão do desfile e afastar ainda mais as candidatas do público. No passado elas desfilavam no salão de danças, em meio ao público, não precisava de palco especialmente construído para a ocasião. Só pela construção do palco a prefeitura teria pagado uma pequena fortuna, sendo que o palco serviu apenas para o desfile das candidatas, o show das bandas aconteceu no próprio palco do clube. Presentes à festa estavam, além do secretário da SECELT, o vice-prefeito, o próprio prefeito, e o convidado especial, o deputado comunista Lélio Costa. A expectativa da premiação era grande.

Durante as semanas que antecederam à festa, o novo prêmio para a vencedora do concurso atiçou a imaginação da população. Segundo os boatos, o novo prêmio já teria uma vencedora certa: a suposta candidata-amante de um comerciante ocupante de um cargo de alto escalão na prefeitura. Nas redes sociais, perfis falsos espalharam que o resultado do concurso já estaria decidido. A festa seria apenas uma encenação para a entrega de presentes a amantes, pagos com o dinheiro público. Em uma cidade em que os boatos surgem a cada esquina, e ainda mais em uma administração marcada por escândalos e fofocas, os rumores rapidamente ganham ares de verdade.

O suposto descaramento da intenção logo causou indignação e ciúmes. As meninas jogadoras da seleção de vôlei do município, que recentemente trouxeram um troféu para casa, mas que receberam uma premiação muito aquém daquela oferecida à musa, logo reclamaram a desvalorização do esporte. Para o povo estava claro, para a prefeitura mais vale a mulher mostrar o corpo.

Para aumentar ainda mais as suspeitas, desta vez a SECELT preparou uma sessão de fotos para apresentar as candidatas ao público. Ótima a ideia no princípio, o resultado foi que o ensaio fotográfico foi francamente desfavorável algumas candidatas, enquanto pareceu favorecer umas outras. As candidatas foram fotografadas sob sol a pino, e algumas a uma certa distância, erros primários até para um fotógrafo iniciante. Além do mais, as fotos, desfavoráveis a algumas candidatas,  serviram só de munição para que alguns mal intencionados fizessem  zombaria e chacota das garotas em redes sociais, numa clara demonstração de falta de respeito ao espírito do concurso. Questionados eram os critérios de escolha das candidatas, quando não a própria falta de seriedade do concurso.

As candidatas desfilam diante dos jurados.

Tais questionamentos não são novos. No ano passado ocorreram após a escolha do Garoto Verão. Mas agora, dada a propaganda e a preparação feita pela prefeitura, a polêmica foi crescendo até o dia do baile. De modo que, no grande momento, todos estavam preparados. A sede social do Camel em si, embora não estivesse completamente lotada para a festa, encontrava-se fervilhando. Alguns amigos e parentes, para torcer para suas candidatas, trouxeram faixas e cartazes, formando uma verdadeira torcida organizada. E a maioria, se não torcia por uma candidata específica, estava francamente contrária a uma candidata, a suposta amante do alto funcionário da prefeitura.  E não somente torcia contra ela, mas estava preparada para acabar com a festa, caso o boato se tornasse realidade.

Anunciados o terceiro e segundo lugar, a expectativa era grande para o anúncio da vencedora. Segundos antes do grande anúncio, como uma artilharia em guerra, pronta para o ataque, ouvia-se os alertas, “preparar as latinhas de cerveja” e “os baldes de gelo estão prontos”... Na hora, o anúncio de que Tássia Paes era a vencedora veio como um alívio e um anticlímax para a turma que veio pronta para estragar a festa.
Tássia Paes é coroada Musa Verão 2017.
Gerusa Balieiro não poderia ser musa, não seria musa. Muito embora tivesse os atributos estéticos, não tinha a simpatia do público. Os boatos espalhados nas redes sociais minaram seu apoio junto ao público. Se vencesse, ganharia a moto mas viveria uma grande vergonha, senão agressão pública.

Durante as semanas, perfis falsos nas redes sociais espalharam o boato de que ela seria amante de um figurão de alto escalão na prefeitura, e que o concurso já estaria todo armado para que ela ganhasse o prêmio. A politização do concurso da Musa Verão fez com que o desfile se tornasse mais do que uma escolha da beleza. As suspeitas lançadas sobre a administração municipal recaíam sobre ela mesma. Perfis falsos e boatos espalhados por pessoas que se dizem de bem acabam com uma reputação e podem estragar um momento que deveria ser dos mais lindos.

Depois que todos respiraram aliviados, o vice-prefeito Evandro, o prefeito Manoel Maranhense e o deputado Lélio Costa puderam discursar calmamente para uma plateia que, se não aplaudiu, também não deu em ninguém um banho de cerveja e de baldes de gelo.


Terminado o mês de julho, passadas as férias, a população volta à sua mesma preocupação: se o salário pago pela prefeitura não vai atrasar, se a agência do Banco do Brasil não vai fechar, se os caixas vão ter dinheiro... Mas nada, nada gera tanta atenção do cidadão portelense como a escolha da Musa Verão.

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sábado, 16 de abril de 2016

ESTRADA DE PORTEL: APOGEU E ABANDONO

Sr. Estanislau na estrada observa o terreno do seu sítio coberto pelo lixo jogado pela prefeitura.

Em meados do século passado, uma leva de maranhenses migrou para o interior de Portel. Eles teriam uma importância vital em um dos marcantes empreendimentos da história da cidade.

Aqueles primeiros maranhenses eram de melhor situação social ou econômica e acabaram abrindo caminho para a vinda de muitos outros. Entre esses pioneiros estavam nomes como Benedito Carvalho, Waldemar Franco, Chico Costa, Doda e Antônio Vieira (o seu Antônio Zomba como é mais conhecido), entre outros. Muitos desses encontraram terras no interior, tal como o velho Carvalho, que se estabeleceu inicialmente no Catispera, rio Pacajá.

Depois desses primeiros, houve uma verdadeira migração de maranhenses para Portel. Estes últimos já não tinham a mesma origem social que os primeiros. Eram de condição econômica bem menos favorável, e migraram para Portel seguindo uma verdadeira epopeia. Eles vieram do Maranhão, como diziam pejorativamente os portelenses da época, “por debaixo do fio”, seguindo o caminho da ferrovia. Eles atravessaram a nado o rio Gurupi, que divide o estado do Pará do vizinho Maranhão, nus carregando as trouxas nas costas. Já no Pará, seguiram a pé o caminho dos trilhos da Estrada de Ferro Belém-Bragança para chegar a Belém e depois continuar a viagem de barco até Portel.
Essa segunda leva de maranhenses já não encontrou terras no interior, não seguiram o curso das águas, para o alto dos grandes rios. Em vez disso, eles abriram caminho por terra, no que depois seria a estrada de Portel.

Foram aqueles maranhenses, que abriram picada na estrada que ia da cidade até o quilômetro dez. Na verdade, a estrada de Portel, para ser justo à história, deveria ser chamada de “estrada dos maranhenses”, em lembrança àqueles primeiros imigrantes, que lá chegaram ainda na década de 1960. Como prova, até hoje ainda existe por lá a Vila dos Maranhenses. Ali, foram os parentes do seu Antônio Zomba, em grande parte, que abriram caminho a terçado da estrada até quase o quilômetro dez.

Na cidade, nem sempre essa segunda leva de maranhenses era vista com bons olhos. Conta-se que o prefeito Ladislau Queiroz não gostava daqueles audaciosos maranhenses que vieram “por debaixo do fio”. Mas, outros já viam o aproveitamento daquela mão de obra recém-chegada como o uma boa oportunidade para o futuro de Portel.

Assim, ali sentado por detrás do balcão de sua farmácia, o comerciante Felizardo Diniz, ele próprio um pernambucano, discorria com amigos e fregueses sobre suas preocupações com o futuro de Portel. “A cidade não podia depender só da Amacol”, dizia ele. Na época, a multinacional exportadora de laminados e compensados estava no auge do seu poderio, empregava diretamente mais de mil pessoas no município, que construíram a cidade em volta da fábrica. Parecia até um desatino falar que a cidade não poderia depender só da Amacol. “O município tem que ter agricultura”, dizia o seu Felizardo.

Quando se elegeu prefeito, para o mandato de 1978 a 1982, Felizardo Diniz cuidou de por em prática os seus planos. Ele idealizou e implementou um grande projeto de assentamento agrícola, demarcando lotes de duzentos e cinquenta metros de frente por mil metros de fundos (área de 25 hectares), que ele distribuiu aos agricultores portelenses, em verdade, grande parte vindos do Maranhão. Felizardo Diniz abriu a estrada até o quilômetro dez, e seguiu adiante, abrindo para o trânsito de veículos até o quilômetro quarenta e sete. Esse era o verdadeiro início da estrada Portel-Tucuruí, um genuíno sonho de saída do isolamento dos portelenses.

Quando criança, eu conheci toda a realidade daquela epopeia nascida dos sonhos do prefeito Felizardo Diniz e dos braços dos maranhenses. Era a coisa mais empolgante.
Até o quilômetro dez, a estrada era ladeada por uma sequência de sítios, todos produtivos e muito bem cuidados.

A estrada em si antes começava no próprio campo de aviação (hoje rua da Vivência), e não passava de um caminho ladeado na direita pelo terreno da Amacol e na esquerda pela floresta de Pinho, que mais tarde daria origem ao nome do bairro. Quase não havia casas nesse trecho.  Mais adiante, a estrada propriamente dita começava na oficina de caminhões da prefeitura, ao lado da qual havia uma vila de casas, onde morava a família do Marajó, um vaqueiro que veio para Portel, oriundo da grande ilha, para trabalhar com gado.

A partir dali, no lado esquerdo da estrada começava então o sítio do meu avô Joaquim Monteiro, constituído de um terreno comprado do seu Luso dos Santos havia muitos anos. Na primeira parte do terreno, junto à estrada, havia um curral, onde durante anos meu pai, Estanislau Monteiro, criou gado. Logo em seguida, havia uma casa de farinha completa, uma das mais bonitas casas de farinha que eu já vi na vida. A casa do sítio em si era muito humilde, de madeira enegrecida, sem pintura. Mais adiante havia a casa do Juscelino, um irmão de criação do papai, que lá morou durante muitos anos com a família. Juscelino na roça ali atrás por longo tempo plantou abacaxi e mandioca. Ao todo o terreno ao todo tinha cerca de 800 metros de frente por um quilômetro de fundura, chegando até quase o igarapé do Muim-Muim.

A viagem de caminhão pela estrada era uma aventura. Os mais sortudos iam na boleia com o motorista, o saudoso seu Jiló, mas a meninada  preferia ir na carroceria, equilibrando-se ao vento sobre o caminhão em movimento. Era uma diversão desafiar o risco de cair de cima do caminhão em alta velocidade, que ia parando ao longo do caminho para pegar agricultores ou carregar algumas sacas. Mais gratificante ainda era ver as propriedades. Aonde chegávamos éramos saudados por perus, galinhas e marrecos. Criação havia bastante. Até hoje quando escuto o canto do anu-coroca ou vejo uma árvore de embaúba me lembro daquelas paisagens.

Passando o sítio do meu pai, havia o sítio do seu Pedro Japonês, com sua horta sempre muito bem mantida. Logo depois tinha o sítio do seu João da Laury, como era conhecido o nicaraguense Juan Valle, casado com a portelense dona Laury. O sítio dele era muito bonito, tinha uma casa muito bem acabada e confortável, cheio de flores ao redor no quintal. Mais adiante havia a fazenda do seu Anésio, um dos maiores produtores portelenses, rico no cultivo de pimenta do reino. Essa fazenda ficava não muito longe do sítio do seu Leal, que cultivava frutas e mantinha uma boa criação de galinhas.

Mais adiante, o sítio do padre, como era conhecido o Sítio Emaús, contava com uma linda plantação de abacaxi, mantido por um projeto da Igreja Católica do qual participavam os adolescentes dos grupos  de jovens da igreja. Foi entre os garotos que iam para o sítio do padre que aconteceu um dos poucos acidentes, de que eu tive notícia, envolvendo alguém cair de caminhão. Foi, se eu não me engano, com o Ajaks Gomes, que caiu e sofreu escoriações nos glúteos, sem muita gravidade, mas de qualquer forma um grande susto, que lhe valeu muitas brincadeiras por parte dos colegas durante um bom tempo.

Havia também a propriedade do seu Chico Anacã, na frente da qual havia uma grande árvore de ingá, na qual subíamos para apanhar os frutos, sempre trazendo muitas sacas de ingá, que vínhamos comendo durante a viagem. Ali também se carregava no caminhão muitas sacas de feijão, arroz, milho e farinha.

Quando se chegava ao quilômetro dez, onde havia um igarapé muito gostoso, junto ao qual frequentemente parávamos para tomar banho, de repente acabava a mata fechava e se deparava com um grande campo de vegetação aberta, semelhante a uma savana, era o Campo de Natureza. Aquele campo de áreas branquinhas, resquício pré-histórico de algum mar interior, era um dos piores trechos da viagem. As rodas do caminhão simplesmente atolavam na área fofa. Muitas vezes a viagem acabava ali mesmo.

Mas quando passávamos o Campo de Natureza, chegávamos então finalmente ao ramal, onde se entrava novamente numa região de floresta fechada. Ali, verdadeiramente, a natureza era inclemente. Novamente os caminhões precisavam fazer um grande esforço para não atolar nos buracos e poças de lama.

Era incrível a dificuldade do percurso da estrada. Passávamos quase uma manhã inteira para percorrer apenas 40 quilômetros! Muitas vezes ficávamos pelo caminho, esperando reforço de um novo caminhão para rebocar o atolado, para que pudéssemos seguir viagem.

Aquele era o último trecho transitável da estrada. Ali, no ramal, em meio à floresta fechada, lá pelos quilômetros quarenta, havia um dos últimos assentamentos agrícolas iniciados pelo prefeito Felizardo Diniz. Era impressionante ver, em meio às agruras da natureza, os agricultores tentando arrancar seu sustento da terra. E ali se colhia muito, cana de açúcar, milho, feijão, mandioca, muita produção, que trazíamos no caminhão na viagem de volta para a cidade.

Mas, infelizmente, todo aquele projeto de desenvolvimento agrícola de Portel não foi além do mandato do próprio prefeito Felizardo Diniz. Em 1982, após a eleição do prefeito Elquias Monteiro, a prioridade deixou de ser o campo e a estrada, e passou a ser a cidade. Elquias começou uma reforma urbana, trouxe o fórum para Portel, abriu a praia da Vila e construiu ali um hospital, ginásio, associação de funcionários, museu, residência oficial do prefeito, além do novo fórum do Tribunal de Justiça.

Os projetos de assentamento do prefeito Felizardo foram abandonados. O transporte dos agricultores e da produção feito no caminhão da prefeitura foi definitivamente encerrado. A agricultura deixou de ser alternativa de desenvolvimento para o município.

Por volta de 2004, quase trinta anos depois de minhas primeiras viagens até o ramal, voltei a percorrer a estrada até o quilômetro dez.

A paisagem que se via agora ali era de abandono e desolação. Dos sítios que antes ladeavam a estrada, só havia ainda o sítio do padre, mas já sem a plantação de abacaxi. Do lado da estrada, só mato e nada de agricultores, a juquira invadiu o terreno onde antes havia as plantações. Nem mesmo o canto do anu-coroca se ouvia mais.

Os agricultores, deixados a pés depois que o prefeito Elquias Monteiro cortou o transporte de caminhão, foram abandonando as plantações, os que ficaram regrediram a um estágio de extrativismo e caça.

Ser agricultor em Portel se tornou sinônimo de dureza, estar “na roça”, como dizia pejorativamente o povo, se tornou sinônimo de estar numa pior.

Com o crescimento urbano, o sítio do papai, no início da estrada, começou a ser ameaçado de invasão. Meu pai, prevendo o pior, começou a dividir o terreno e a vender lotes, pois era impossível proteger toda a área do terreno. Sabendo da importância da área para a expansão da cidade, o prefeito Elquias, já em seu segundo mandato, entrou em negociação com o meu pai para comprar o terreno, mas como o pagamento das parcelas não foi concluído pelo prefeito, meu pai reteve parte do sítio onde ficava a casa do meu avô e do seu Juscelino. A área onde antes ficava o curral foi entregue à prefeitura.

Porém, com o passar do tempo, os invasores começaram a ameaçar de invadir o restante do terreno. Presenciei, em certa ocasião, cena dramática de o meu pai enfrentar invasor armado com terçado na mão. Depois, a prefeitura mesma começou a fazer pressão sobre a posse do terreno, mandando o próprio caminhão da prefeitura jogar lixo no local, de modo a tentar caracterizar o abandono da propriedade.

Em 2004, ano de eleições para prefeito, foi a última pá de cal. Os invasores fizeram a investida final sobre o restante da área do sítio, armados e munidos de material de construção entregue por caminhões contratados por candidatos às eleições , estes sedentos de votos dos miseráveis, eles rapidamente tomaram para si o restante da propriedade. Naquele ano havia levado amigos agrônomos para iniciar um projeto agrícola em Portel, a invasão violenta e premeditada pôs fim aos planos.

Hoje quase o bairro inteiro da Cidade Nova se localiza em área antes pertencente ao sítio do meu avô. Posteriormente meu pai ganhou na Justiça direito a indenização da prefeitura. A negociação do pagamento seria feita no mandato do prefeito Pedro Barbosa, eleito em 2004. Não tenho detalhes dessa negociação, uma vez que eu não estava próximo e que meu pai nutria muita amizade com o Pedro, mas o preço pago pela prefeitura foi simbólico diante de toda a extensão do terreno. Nunca pedimos reparações posteriores.

Este fato até hoje é utilizado por adversários anônimos para me atingir ou tentar manchar a reputação do meu pai, alegando que meu pai teria vendido o terreno mais de uma vez. Mas a indústria das invasões com motivações políticas não faria só a nós de vítimas em Portel. Em 2008 (outro ano de eleição) foi a vez da grande área da Amacol, a empresa multinacional que um dia simbolizou todo o sonho de grandeza do município, ser violentamente invadida. A mensagem era clara: não deveria haver espaço para outro poder em Portel que não o político.


Assim, com a Amacol fechada e seu terreno invadido, e os agricultores abandonados na estrada à própria sorte, cumpriu-se o desígnio sonhado pelos políticos: a prefeitura se tornou quase que a única fonte de empregos no município. E quem quisesse ter um emprego, tinha que pedir aos políticos.
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Este texto foi pensado inicialmente para ser uma trilogia junto com dois outros:

O objetivo era mostrar o passado e as novas possibilidades de desenvolvimento para o município. Esses artigos deveriam ser lidos em conjunto.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

DESEMPREGO EM PORTEL SEGUE O RITMO DO RESTANTE DO PAÍS

Depois de um ano de recuperação em 2014, o desemprego em Portel voltou a crescer em 2015, como já havíamos adiantado em meados do ano passado. Essas são as informações reveladas pelos números divulgados pelo CAGED, do Ministério do Trabalho. O ano de 2015 fechou com um saldo de 200 contratações em carteira assinada contra 262 demissões, resultando em uma perda líquida de 62 postos de trabalho.

Esse resultado negativo segue a tendência geral de perda de emprego, observada pelo país inteiro. É um dado desanimador principalmente quando comparado com o período de 2011 a 2013, em que Portel perdeu 1.156 postos de trabalho. Mas não é tão ruim quando comparado com o município vizinho de Breves, que teve uma perda líquida de 95 postos de trabalho. Breves amarga o segundo ano seguido de aumento do desemprego. Enquanto na capital, Belém, em seu terceiro ano de retração, fechou com quase doze mil empregos a menos em 2015.

Os dois municípios vizinhos oferecem, aliás, um bom comparativo na solução para a crise do fim do ciclo da indústria madeireira, que aconteceu em 2008. Enquanto Breves levou um golpe ainda mais violento que Portel com fechamento das serrarias, sofrendo perda de 1.201 empregos de carteira assinada, o município dos furos do Marajó logo se recuperou, encontrando vocação como prestadora de serviços de saúde e educação para os moradores das cidades vizinhas.

O Hospital Regional de Breves abriu em 2010 e, no período, várias faculdades particulares estabeleceram-se no município. Posteriormente o campus da UFPA em Breves foi ampliado, passando a oferecer mais cursos, inclusive de pós-graduação. Atualmente, dezenas de estudantes de Portel viajam diariamente para Breves, para cursar a faculdade, sem contar estudantes de outros municípios. Como resultado, entre 2011 e 2013, enquanto Portel perdeu 1.156 postos de trabalho, Breves ganhou 778 novos. Mas essa fase de crescimento do município dos Furos do Marajó parece ter se esgotado, e Breves entra no segundo ano de crescimento do desemprego.

De qualquer forma, fica o exemplo para Portel: cada município deve investir na sua vocação. Enquanto para Breves está localizada em uma ilha, junto a uma via fluvial que é passagem entre Belém e as principais cidades da Amazônia, e tem naturalmente a lucrar com o comércio e a prestação de serviços, Portel é continente, e fica localizada em uma ponta, que é fim de linha dos barcos.

A saída para Portel é investir em produção agrícola, na estrada, e no escoamento dessa produção para o restante do país, e do mundo. Esse é o remédio contra o desemprego. 

domingo, 3 de janeiro de 2016

COMUNIDADES DO CAXIUANÃ, BOLSA FAMÍLIA E 'EFEITO MORTADELA'



O artigo da Folha de São Paulo

Na edição de 19 de novembro último, um artigo publicado pelo jornal Folha de São Paulo transformou em notícia nacional os hábitos alimentares de uma comunidade no interior de Portel e sua relação com o programa Bolsa Família, do Governo Federal, ao mesmo tempo em que desnudou todo o preconceito da mídia contra os que precisam dos programas sociais.

O artigo, intitulado “Na Amazônia, Bolsa Família causa ‘efeito mortadela’ entre ribeirinhos”, divulgou os resultados de pesquisa realizada pela bioantropóloga norte-americana Barbara Piperata junto a comunidades do Caxiuanã, no rio Anapu, interior de Portel.


Tomando como ponto de partida uma pesquisa científica, o artigo é um belo exemplo de como o desconhecimento sobre a Amazônia e o viés ideológico da mídia distorcem a visão dos fatos.


Em seu artigo, o principal foco do jornalista Gabriel Alves é quanto à conclusão da pesquisadora de que o recebimento do benefício do Bolsa Família diversificou, mas não melhorou a alimentação dos ribeirinhos. Resultado esse chamado pelo jornalista de ‘Efeito Mortadela’, em razão da introdução desse item na alimentação dos beneficiários. Entre os comentários publicados no site, muitos leitores foram rápidos em condenar o “assistencialismo” bancado pelo Governo Federal.


Assim, o tom do artigo é claramente negativo quanto aos efeitos do programa Bolsa Família, ainda que mencione a afirmação da bióloga quanto a ser difícil afirmar se os impactos do programa são bons ou ruins. Na conclusão, afirma-se também que não há interesse por parte dos pesquisadores brasileiros em pesquisar regiões afastadas, e que tampouco houve interesse por parte dos representantes dos governantes quanto aos resultados da pesquisa.


Apresentação da Pesquisadora Barbara Piperata

A professora Barbara Piperata é bióloga formada pela Universidade do Colorado, nos Estados Unidos, onde obteve PhD em antropologia, e atualmente é professora na Universidade de Ohio. Seu principal campo de pesquisa é em energia reprodutiva, no estudo de práticas e estratégias pós-parto visando a conservação de energia para a lactação pela mãe e as condições de saúde do bebê.

Realizados nas comunidades ribeirinhas de Caxiuanã, no rio Anapu, em Portel, seus estudos comprovaram a situação de insegurança alimentar na população do interior do município e registraram detalhadamente os hábitos alimentares dos entrevistados. Os dados foram levantados em dois períodos. Primeiro em 2002, quando a bióloga morou durante dois anos no Caxiuanã, e avaliou 469 pessoas. O segundo em 2009, quando foram examinados 429 indivíduos.


Os dados foram publicados em 2011, em um artigo no American Journal of Physical Anthropology. Em novembro, Piperata apresentou os resultados de seu trabalho em evento do Centro de Pesquisa em Alimentos, na USP.

As conclusões da Pesquisa

Antes de fazer uma análise superficial e enviesada, é preciso refletir bastante sobre as constatações da pesquisadora norte-americana em Caxiuanã.

Entretanto, ao fazer aqui uma reflexão sobre a publicação da Folha de São Paulo, é preciso admitir, em primeiro lugar, que não tive acesso direto ao artigo da professora Piperata, o qual não está disponível gratuitamente ao público. Logo, não questiono o valor da pesquisa da autora, a qual se reveste da maior importância. Minhas conclusões se referem àquelas relatadas no artigo da Folha de São Paulo.


A principal conclusão do artigo do jornal é de que “a renda extra do Bolsa Família não melhorou os hábitos alimentares na região”. Os ribeirinhos agora conseguem ter acesso a produtos que eles antes apenas ocasionalmente podiam obter, tal como feijão e arroz, mas, por outro lado, aumentou o consumo de alimentos não saudáveis, tais como carnes enlatadas e biscoitos, ricos em gordura e sódio. Além desses produtos, aumentou o acesso a carne seca, mortadela e bens de consumo duráveis, tipo aparelhos de televisão e geradores elétricos.

Antes, os ribeirinhos dependiam essencialmente da pesca e caça, além da produção local de farinha de mandioca. Agora eles têm condições de comprar uma variedade maior de produtos no comércio da cidade mais próxima, através do auxílio do Bolsa Família.


A professora constatou também que, apesar de ter havido uma redução da ingestão energética total, houve ganho de peso por parte das mães. Uma possível explicação seria a diminuição da atividade física, em particular do trabalho na lavoura de mandioca. Antes da introdução do Bolsa Família na região, em 2005, 100% dos lares cultivavam mandioca. Em 2009, eram apenas 65%.

Essas mudanças geraram, segundo a professora, dois efeitos. Um é o “efeito mortadela”, ou seja, a introdução de alimentos industrializados na alimentação, tal como a mortadela. O outro é o “efeito fim do mês”, momento em que começa a escassear a quantidade de comida comprada na cidade no início do mês, quando o caboclo vai receber o benefício do Bolsa Família.


Professora Piperata apresenta resultados de sua pesquisa a comunidade do Caxiuanã. (Fonte: Universidade do Colorado)

Outros fatos observados pela professora parecem bastante evidentes, tal como a falta de atenção à saúde e à educação. Isso se revela, por exemplo, na baixa estatura média dos indivíduos e no baixo índice de massa muscular, resultantes da deficiência nutricional da população. Essa deficiência nutricional resulta, por sua vez, da própria falta de conhecimento da população quanto ao valor nutricional dos alimentos.


Reflexões sobre o Resultado da Pesquisa


Minha primeira reação foi de surpresa, quando li essa notícia da introdução da mortadela no cardápio de uma população interiorana de Portel. Desde as minhas mais remotas lembranças a mortadela é consumida pela população do interior. Da mesma forma que a carne em conserva, por não exigir de refrigeração, a mortadela é uma das fontes de proteína preferida pelo caboclo do interior, com a particularidade de que ele prefere comê-la frita, principalmente acompanhando o açaí.


No entanto, aqui é preciso fazer uma digressão sobre o atual ambiente político que vive país.


Para o leitor (e eleitor) das grandes cidades, ‘mortadela’ se tornou um nome pejorativo para chamar as pessoas que apoiam o Governo Federal, ou se beneficiam dos programas assistenciais do governo. Essa expressão parece ter origem na notícia de que, em agosto passado, o governo teria pagado lanche de pão com mortadela para quem fosse à manifestação em seu favor. Daí que a notícia da introdução da mortadela na alimentação dos beneficiários do Bolsa Família na Amazônia viesse perfeitamente a calhar para aqueles que ridicularizam os programas assistenciais do Governo Federal e aqueles que são beneficiados.


Todavia, intrigado quanto ao consumo de mortadela pelos caboclos do  Caxiuanã, resolvi tirar algumas dúvidas. Dias desses, como tinha em casa uma visita que é moradora do rio Anapu, resolvi perguntar a ela se o hábito de comer mortadela é novo para as comunidades do Caxiuanã.

Ela me veio com uma resposta ainda mais intrigante. Segundo ela, os moradores de Caxiuanã, sempre se confiaram na abundância de carne de caça, como fonte de proteína animal, por isso não comiam com frequência mortadela. Agora, a compra de mortadela na cidade seria um resultado do empobrecimento da fauna na região da Floresta de Caxiuanã. Assim, logo aquela que sempre foi uma das florestas mais ricas e intocadas de Portel, estaria vendo na atualidade o empobrecimento da sua população animal, sobretudo das espécies mais caçadas, tais como pacas, cutias, veados e tatus.

Outra conclusão que parece equivocada do estudo é afirmar que o empobrecimento da dieta do ribeirinho seria resultante do Bolsa Família, quando na realidade ela tem como causa a falta de conhecimento e os próprios costumes e crenças da população. Essa falta de conhecimento quanto ao valor nutricional dos alimentos é notória e se mostra na aversão do povo em comer frutas e verduras, que tem a população de Portel, que não vem de hoje.


A população nunca deu valor ao consumo de frutas e verduras. Mesmo na zona urbana de Portel, sempre foi abundante o número de árvores frutíferas, principalmente mangueiras, murucizeiros, goabeiras e ameixeiras. No entanto, a população não cultivavava o costume de tomar sucos de fruta natural, a não ser os sucos congelados, ou ‘chopes’ como chamados pela população. Em vez disso, era generalizado o consumo de sucos artificiais em pó, o Tang ou Ki-Suco, tão populares até os anos 1980, e fabricados por multinacionais norte-americanas.

Também no interior o cultivo de pomares e árvores frutíferas não era incentivado. Minha visita conta que quando propôs ao pai plantar goiabeiras, recebeu a seguinte resposta: “as frutas servem só pra atrair pipira (Cyanicterus cyanicterus)”.

Também o consumo de verduras e legumes sofria grande resistência por parte dos moradores. Lembro que quando pedia salada durante as refeições, um amigo sempre respondia “quem gosta de comer folha é jubuti e preguiça”.


Diferente era o comportamento quanto aos frutos das palmeiras, tais como açaí, bacaba e pupunha. Mas as frutas nunca foram vistas como boa fonte de alimento. Mesmo as mangas, tão abundantes na cidade, jamais foram colocadas no mesmo status que o açaí. Lembro que apesar de ter comido tanta manga em Portel, eu só vim a descobrir como era gostoso o suco de manga na casa de uma missionária alemã, que o servia durante as visitas. Da mesma forma procediam os americanos, que moravam na Amacol, e estavam o tempo todo dando às suas crianças mamadeiras com suco natural de frutas, fato esse que eu nunca vi por parte da população local. Apesar da abundância de frutas.


No entanto, o jornalista se mostra incapaz de saber analisar a natureza das mudanças constatadas pela pesquisadora norte-americana.


Essa incapacidade advém da flagrante falta de conhecimento do jornalista da Folha quanto aos hábitos dos moradores da Região Amazônica. Em particular um dado deixa clara essa ignorância. O texto afirma que os ribeirinhos viajam oito horas de Caxiuanã até a cidade mais próxima, que seria Breves. Mas se tivesse pelo menos buscado ver onde se localiza Caxiunã no mapa, teria visto que a cidade mais próxima é Portel, onde fica a sede do município, e não Breves.


Enfim, as transformações no modo de vida dos ribeirinhos no interior da Amazônia foram muitas nos últimos anos. Mas o jornalista se deteve num só, que ele chamou de ‘Efeito Mortadela’, expressão essa provavelmente não utilizada pela cientista em seu artigo, mas que serve ao autor para menosprezar os beneficiários dos programas do Governo Federal.


Esse raciocínio enviesado, próprio da imprensa conservadora, perde de vista algumas das transformações mais profundas pelas quais passa o ribeirinho no interior da Amazônia após a introdução do Bolsa Família.


Antes a vida do caboclo se regia pelos ditames da natureza, tal como a época de colheita do açaí, da mandioca ou a pesca do peixe. O ritmo de vida era ditado pela natureza. Mas hoje existe o “efeito começo do mês”, como diz a pesquisadora. Os ribeirinhos têm data todo início do mês para fazer viagem até a cidade mais próxima para comprar os mantimentos necessários e, a partir de então, regrá-los até o início do próximo mês. Ou seja, os caboclos assumem um ritmo de vida dos assalariados urbanos.


Existem outras transformações ainda mais profundas por que passam as comunidades no interior da Amazônia causadas pelo acesso aos programas do Governo Federal.


Desde o fim do Ciclo da Borracha, o caboclo amazônida viveu relativamente isolado do capitalismo mundial. Não produzindo nenhuma commodity de maior valor no mercado nacional ou internacional, ele se recolheu a um modo de extrativismo autônomo, em que a maior parte do que ele precisava para sobreviver vinha diretamente da natureza, cultivando apenas a mandioca, a qual, além do consumo próprio, servia como moeda de troca no escambo com os regatões.


Hoje o seu modo de vida está mudando. Até a ida à cidade não se dá mais de canoa a remo, mas sim em uma ‘rabeta’ movida a motor a óleo diesel. Seja no óleo diesel ou na fonte de proteína, os caboclos da Amazônia se encontram hoje cada vez mais dependentes do consumo de produtos fabricados pelas grandes empresas nacionais e multinacionais.


Desta forma, acontece assim a inserção do caboclo amazônida no capitalismo internacional (utilizando-se de uma expressão dos teóricos marxistas), pelo incentivo ao consumo. Ironicamente, aquele mesmo mercado que fecha suas portas aos seus produtos dos ribeirinhos, é o mesmo que aceita esses ribeirinhos apenas na condição de consumidores. Mas não na condição de produtores. O ribeirinho da Amazônia deve ser inserido no mercado capitalista apenas em condição passiva, ou seja, no papel de consumidor dos produtos dos grandes conglomerados industriais da Região Sudeste.


É esse o principal efeito do Bolsa Família na Amazônia.

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

A SITUAÇÃO DOS AGRICULTORES EM PORTEL

Dona Júlia Serrin, em sua maloca, mostra sua certificação de agricultora familiar. (Foto: Hélio Monteiro)


No sábado, dia 8 de agosto, em Portel, soube da inauguração de uma nova maloca na Prainha, que estava marcada para o dia seguinte. Como não conhecia como estava a praia após a inauguração da nova estrada, fiquei curioso em ir ver o local.

Ainda que sem querer, essa ida à Prainha acabou me proporcionando uma amostra muito boa da situação do agricultor em Portel.

O Vendedor de Laranjas

Na manhã do dia seguinte, após a saída da procissão do círio de Nazaré, me apressei em procurar um moto-táxi para ir à Prainha.

Direto em frente de casa havia um moto-taxi parado aproveitando a pausa para saborear algumas laranjas, que um senhor vendia em um carro de mão. Negociei a corrida e, enquanto aguardava o moto-táxi terminar de sorver suas laranjas, aproveitei para conhecer melhor o vendedor. Perguntei ao vendedor se as laranjas eram produzidas ali em Portel mesmo. Ele respondeu que sim, que eram produzidas ali na estrada no sítio de seu sobrinho Tangará, um conhecido professor.

Perguntei então como havia sido a colheita, se havia sido boa. Ele disse que sim, que as laranjeiras estavam carregadas de laranjas, mas que o proprietário não viu a cor do lucro. Quis saber então o porquê da situação. Ele me explicou que não havia condição de vender em Portel toda a produção, que a colheita havia sido muito boa, mas agora o produtor não achava pra quem vender. Ele me contou ainda que, apesar de haver produção local, muitos supermercados preferiam comprar de fora, trazer laranja de Belém do que comprar do produtor em Portel mesmo. Então, a alternativa pra ele era tentar vender na rua, com seu carrinho de mão.

Fiquei impressionado com a situação. Apenas um ano antes eu ouvi um vendedor de lanche reclamar da falta de polpa de fruta em Portel para fazer suco. Agora havia laranja, mas o produtor não conseguia vender toda sua colheita.

Essa realidade não é exclusividade de Portel. À medida que as antigas mercearias dão lugar aos supermercados, mais difícil se torna para os agricultores encontrar espaço para fazer seu produto chegar até os consumidores. Ao agricultor, só resta vender seu produto na beira das estradas, ou nas cidades, na carroceria de caminhões ou em bicicletas cargueiras (como é o caso do agricultor Eliseu, que eu já mostrei aqui). Enquanto os supermercados preferem comprar frutas de fora.

Esse fato não é exclusividade de Portel. Em Belém mesmo, as bananas vendidas nos grandes supermercados, como o Líder e o Yamada, vêm do Sítio Barreiras, na Bahia, irrigadas com as valiosas águas do rio São Francisco, o Velho Chico, um rio que está secando. Enquanto aqui no Pará temos abundância de água, mas nossos produtores não tem acesso aos grandes supermercados. O resultado está no preço que o consumidor paga pelo alimento. Em um restaurante, um copo de suco chega a custar mais que o dobro que um de refrigerante.

Dona Júlia Serrin

Terminado o moto-taxista de chupar suas laranjas, rumamos para a Prainha.

Ao chegarmos ao local, reparei que não sabia exatamente o endereço da nova maloca, que ia ser inaugurada. Por descuido havia me esquecido de trazer o folder, nem pensava que era preciso. Saímos então procurando o local, pois há hoje na Prainha várias localidades que funcionam como bares.

Chegamos à maior delas, e o moto-táxi disse: “só pode ser aqui”. Na verdade a maloca já havia sido inaugurada semanas atrás, mas, como eu não tinha mais muito tempo para procurar, resolvi aproveitar a paisagem. Fiquei tomando uma cerveja e apreciar a praia.

Olhando o bar, vi que havia na parede da barraca um Selo de Identificação de Participação na Agricultura Familiar (SIPAF). Perguntei pela dona, disseram que ela ainda estava por chegar. Quando chegou, aproveitei para conversar com ela.

Cansada, tinha acabado de chegar do campo. Parecia mais uma “boia fria”, com chapéu e panos na cabeça cobrindo os cabelos. Era a dona Júlia Serrin, agricultora do rio Acuti-Pereira.

Dona Júlia Serrin parece jovem, mas já tem a pele marcada de quem trabalhou muito tempo sob o sol e as mãos grossas de quem fez da enxada seu instrumento de trabalho.

No entanto, em vez de se reclamar do trabalho na roça, ela conta com orgulho sua luta pela terra e o esforço para plantar, enquanto puxa uma pasta e começa a mostrar certidões, diplomas, fotos, certificados e mostra um mapa georreferenciado do seu terreno, como que ilustrando diversos momentos sua vida, que ela exibe como troféus pelo seu esforço.

Ela conta também da cooperativa dos agricultores do rio Acuti-Pereira, de como aquela comunidade, tão sofrida após a praga dos morcegos há dez anos atrás, renasceu após os projetos da ONG Piaberu.

Além das frutas, este ano a colheita de feijão-caupi foi boa, disse ela, mas, no entanto, não há em Portel onde escoar a produção. Ela no final perdeu 150 quilos de feijão, o equivalente a duas sacas e meia de sessenta quilos, por não ter para quem vender.

Da mesma forma que o vendedor de laranjas, ela não encontra espaço nos supermercados de Portel para comercializar seu feijão. Para piorar, há a preferência do consumidor pelo feijão rajado vermelho, mais caro, em vez do feijão-caupi, mais barato. Assim, o consumidor de Portel acaba consumindo feijão produzido em Unaí, Minas Gerais, cuja produção muitas vezes emprega até trabalho escravo, em vez de comprar feijão cultivado no município, pelo seu irmão ali do lado.

Os certificados mostrados por dona Júlia Serrin comprovam a participação dos agricultores nos cursos da Secretaria de Desenvolvimento de Portel (SEDES), Emater, SENAR, Embrapa, assim como a obtenção do Selo de Inspeção Municipal e do Selo Identificação de Participação da Agricultura Familiar (SIPAF). Os agricultores participaram de tudo quanto era treinamento que estava à sua disposição. Mas agora que conseguem produzir, dona Júlia e os outros produtores não encontram mercado para os seus produtos.

Sem conseguir escoar toda sua produção, dona Júlia Serrin decidiu então abrir uma maloca na praia, para assim conseguir vender sua polpa de fruta, sucos e seus pratos de refeição.

SIPAF

Essa é a realidade de um país que historicamente preferiu investir na agricultura de exportação em vez de priorizar a agricultura familiar, a qual coloca comida na mesa do cidadão. Como resultado, o preço da saca de feijão custa mais que uma saca da soja, fazendo com que o alimento chegue mais caro ao consumidor.

Uma das iniciativas mais recentes do Governo Federal para corrigir essa distorção foi a criação, há seis anos, do Selo de Identificação na Agricultura Familiar (SIPAF). O selo é concedido a cooperativas que reúnem diversas famílias que tem como a atividade de renda a agricultura. No caso do agricultor, o único requisito é ter o CNPF regularizado (ou CNPJ no caso da cooperativa). E se o agricultor ou a cooperativa possuir a Declaração de Aptidão ao Pronaf, a mesma tem que estar válida. O selo tem validade para cinco anos e o Governo Federal já autorizou mais de mil concessões, para mais de dez mil itens.

Mas em Portel, apesar de possuir o selo, dona Júlia Serrin ainda não percebeu os benefícios do programa.

Programa do SIPAF do Governo Federal. (Fonte: MAPA)

PNAE

Uma outra possibilidade de escoamento da produção dos agricultores de Portel poderia ser pela Prefeitura, pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar. Esse programa, que foi criado ainda em 1979 durante o Regime Militar, passou a prever a aquisição de produtos da agricultura familiar para a merenda dos alunos, a partir de 2009, por meio da Lei nº 11.947.

Pela lei, pelo menos 30% dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) devem ser utilizados para a aquisição de gêneros da agricultura familiar, sendo que essa aquisição é dispensada da exigência de processo licitatório.
Só no ano de 2014, o Governo Federal repassou para a Prefeitura de Portel, por meio do FNDE, o valor de R$ 1.854.224,00 (dados do portal do FNDE). Se fosse respeitado o mínimo exigido pela lei, pelos R$ 556 mil deveriam ter sido comprados dos agricultores familiares do município. No entanto, não há nenhum sinal de compra nesse montante.

A razão mais plausível para essa omissão é que os próprios agricultores não estejam em condições de negociar com a Prefeitura. Pois, pela mesma lei, o percentual mínimo a ser adquirido da agricultura familiar pode ser dispensado no caso de inviabilidade de fornecimento regular e constante, ou que não haja a possibilidade de emissão do documento fiscal correspondente. Dado que a organização em cooperativas ainda é evento raro em Portel, dificilmente o agricultor individual estaria em condições de emitir documento fiscal.

Deste modo, mesmo dona Júlia Serrin tendo o SIPAF, o PNAE não consegue beneficiar o agricultor em Portel.

Assim, sem conseguir vender para a Prefeitura e sem acesso ao mercado em Belém, dona Júlia decidiu abrir uma maloca na praia para oferecer parte da sua produção diretamente ao consumidor.

Mas nem todos os agricultores têm a opção de vender diretamente ao consumidor.

A Prefeitura e o Incentivo à Produção Local

Apesar de não querer me basear em evidência anedótica, como se diz em estatística, está claro que esta é a situação de muitos agricultores em Portel.

Nos últimos anos a Prefeitura tem feito um grande esforço no sentido de incentivar a produção agrícola no município, por meio, sobretudo, da distribuição de sementes e treinamento de agricultores. Os frutos dessa iniciativa não deixaram de surgir. Hoje Portel colhe mais, e a colheita está mais variada.

Alguns produtos têm acesso fácil ao mercado. Esse é o caso da farinha de mandioca, que conta com atravessadores que negociam direto com o produtor. Outros, como os horticultores, conseguem comercializar sua colheita facilmente no pequeno comércio, ou vendendo diretamente às donas de casa.

Contudo, se a Prefeitura de Portel não quiser ver boa parte do seu esforço de apoio à produção agrícola ir por água abaixo, ela deve fazer um planejamento completo, não só do plantio e cultivo, mas também da comercialização. Nesse sentido, fazer com que os comerciantes incluam os produtos da agricultura familiar nas prateleiras de seus comércios não é tarefa tão difícil.

Como o maior comprador do município, a Prefeitura tem um enorme poder de persuasão para convencer os comerciantes a oferecer a produção local aos seus fregueses. Nesse sentido, o prefeito tem como pressionar os comerciantes a colocar a produção local em suas prateleiras. Da mesma forma que tem promovido localmente a campanha “Compre do Pequeno Negócio”, do SEBRAE, a Prefeitura pode incentivar a agricultura familiar junto ao comércio local, que atualmente continua comprando de fora aquilo que pode adquirir localmente. Melhor ainda seria auxiliar os agricultores a conquistar mercado em outros municípios. Mas para isso é fundamental que os produtores possam assegurar primeiro o mercado municipal.

Se não tomar iniciativa no sentido de planejar a comercialização do produto agrícola, o resultado será a redução da área plantada, pela falta de condições do agricultor para escoar a produção, e o consequente agravamento da pobreza no município.

E essa vai ser mais uma oportunidade perdida de gerar esperança de emprego para a população jovem do município.

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

SALDO POSITIVO DE EMPREGO NO MÊS DE JULHO EM PORTEL

>meta name="keywords" content="Portel, empregos, CAGED, férias, Pará, Amazônia">

Em julho houve 84 contratações de carteira assinada contra 13 demissões, saldo líquido positivo de 71 novos empregos. Esse é um dado bom haja vista a crise atual por que passa o país, mas é menor do que o número do ano passado, quando houve um saldo positivo de 128 contratações no mesmo mês, dados do CAGED do Ministério do Trabalho.

Só a título de comparação, no município vizinho de Breves houve perda líquida de 38 postos de trabalho de carteira assinada neste mês de julho. Ainda sobre o município vizinho, muito embora tanto Portel quanto Breves tenham sofrido com a crise do fechamento das madeireiras em 2008, Breves passou passou em seguida por um vigoroso surto de crescimento, enquanto Portel amargou um aprofundamento da crise. Mas, no ano passado, enquanto Portel voltou a ter leve crescimento no emprego após quatro anos de demissões, Breves fechou o ano no negativo com perdas líquidas de 215 postos de trabalho após quatro anos de crescimento na administração do prefeito Xarão Leão. Esses dados confirmam o mau momento por que passa o prefeito de Breves.

Os números de emprego ressaltam mais uma vez a importância das férias de julho, e do investimento da Prefeitura de Portel na programação, para a geração de emprego (leia aqui mais sobre a relação entre geração de empregos e férias em Portel). De qualquer forma, o desafio é não só manter, mas aumentar essa geração de emprego formal. É importante priorizar a geração de renda como um todo, não só o emprego em carteira.